No final do mês de agosto deste ano, o Governo sancionou a Lei 14.195/21, que se trata de uma importante norma e, que foi divulgada na imprensa, com o enfoque de tratar-se de uma Lei que facilita a abertura de empresas, no entanto, o escopo das novas regras legislativas é bem mais abrangente do que foi noticiado e, possui objetivos mais amplos, de facilitar e desburocratizar a abertura de empresas e melhorar o ambiente de comércio, especialmente o internacional.

Um dos pilares da nova Lei, está na previsão de desburocratização do processo de abertura de empresas, que passa por várias alterações, como a eliminação de análises prévias de endereços das empresas; automatização do processo de checagem de nomes empresariais; unificação das inscrições fiscais municipais, estaduais e federais; concessão automática de licenças e alvarás de funcionamento para negócios de segmentos considerados de médio risco; além de tratar da composição, funcionamento e as competências do Comitê Gestor da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios, tudo com a intenção de facilitar a abertura de novas empresas, a partir da exclusão de critérios que podem ser considerados como fases burocráticas do processo.

Além de facilitar o processo de abertura de empresas, a Lei também busca melhorar o ambiente de negócios e, garantir aumento de investimento nas atividades empresariais e, para isso, promoveu profundas mudanças, como a transformação automática das empresas individuais de responsabilidade limitada (Eirelis) em sociedades limitadas unipessoais. De maneira prática, essa alteração implica que o empreendedor, que no modelo Eireli era o proprietário e único sócio de uma microempresa, passe a não precisar ter sócios algum, e ainda poderá ter patrimônio próprio separado da empresa, por meio de uma sociedade unipessoal de responsabilidade limitada.

Nessa mesma perspectiva, de melhoramento do cenário de investimentos, a Lei promoveu mudanças para aumentar a proteção de investidores minoritários, por meio da alteração da Lei das Sociedades Anônimas. que aumentam o poder de decisão dos acionistas, inclusive minoritários, mediante a ampliação de prazos de antecedência para convocação e envio de informações para uso nas assembleias; o melhoramento das regras relacionados à comunicação; a vedação do acúmulo de funções entre o principal dirigente da empresa e o presidente do Conselho de Administração.

No que se refere aos investimentos vindos do exterior, a nova Lei cria o voto plural, situação que permite que empresas brasileiras que abram o capital no exterior, possam manter o controle acionário por meio desse instrumento, mesmo vendendo a maior parte de suas ações, situação que até então era vedada no Brasil e, cujo reflexo, espera-se que resulte no maior acesso ao mercado de capitais.

Para entender o real benefício do voto plural, imagine-se uma empresa, cujos fundadores procuram investidores para alavancar seus projetos (investir na empresa), mas não pretendem vender suas ações, uma vez que, dentro da lógica do que era previsto até então, isso implicaria na perda do poder de controle. A partir da admissão em nosso ordenamento da possibilidade de voto plural, ou seja, passando a estar permitida uma dissociação entre poder político e capital investido, será mais simples para as companhias receberem novos investimentos, sem perder o controle da empresa.

A Lei também instituiu dispositivos, com a finalidade de desburocratizar, simplificar e facilitar o comércio exterior de bens e serviços, através da disponibilização de guichê único eletrônico aos operadores de comércio exterior e da padronização e simplificação do pagamento de taxas relacionadas às operações dessa atividade. A medida abrange também a regulamentação das profissões de Tradutor Público e de Intérprete Comercial, com modernização e desburocratização dessas profissões, permitindo que tradutores atuem em todo país e possam realizar seu trabalho em meio eletrônico, garantindo maior segurança jurídica à matéria, indispensável ao desenvolvimento do comércio exterior e à evolução do Brasil em diversos outros indicadores relacionados ao ambiente de negócios.

Ainda na linha de melhorar o ambiente de negócios e aumentar os investimentos, especialmente o estrangeiro, a Lei cuidou de uma preocupação recorrente dos investidores, que é o efetivo retorno dos investimentos, e o risco de possíveis calotes, sempre afastam investidores e, nessa linha, outro ponto de destaque é o aumento da agilidade na cobrança e recuperação de crédito mediante a autorização do Poder Executivo para instituir o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (SIRA), sistema que será capaz de reunir dados de pessoas físicas e jurídicas com o objetivo de reduzir o custo de transação da concessão de crédito através do aumento da efetividade das ações judiciais que envolvam a recuperação de créditos. A lei também prevê a criação do cadastro fiscal positivo, instrumento que premia o bom contribuinte, atribuindo tratamento adequado conforme o histórico de conformidade do beneficiado.

Outras inovações da lei são o aumento da segurança jurídica via consagração legal da prescrição intercorrente e da citação eletrônica de empresas públicas e privadas; e a desjudicialização das cobranças dos Conselhos Profissionais, os quais continuarão podendo tomar medidas administrativas de cobrança, tais como a notificação extrajudicial e a inclusão em cadastros de inadimplentes, contribuindo para diminuir a sobrecarga judiciária brasileira.

A norma traz a possibilidade de as sociedades anônimas, limitadas e corporativas possam emitir notas comerciais. A nota comercial é título executivo extrajudicial, que pode ser executado independe de protesto, com base em certidão emitida pelo escriturador ou depositário central, conforme o caso, sendo que ela poderá ser vencida na hipótese de inadimplemento da obrigação constante de seu termo de emissão.

Evidentemente, que não é possível prever nesse momento, o quanto será positiva a aplicação das regras trazidas pela nova legislação, no entanto, espera-se que ela melhore o ambiente negocial no país, facilite a abertura de empresas, garanta segurança jurídica e medidas hábeis a aumentar o investimento na atividade empresarial, tanto nacional como estrangeiro.

Douglas de Oliveira, Mestre e Doutorando em Direito Empresarial, sócio do escritório Oliveira, Vale, Securato e Abdul Ahad Advogados S/S.

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