EDUCATION: PREREQUISITE FOR ACTION IN THE MEDIATION PROCESS 

Elaine Cler Alexandre dos Santos 

Resumo: O presente trabalho faz parte da tese de doutoramento intitulada “A mediação e a educação como recurso de empoderamento e pacificação social para o desenvolvimento local” e trata da mediação, educação, empoderamento e desenvolvimento local. O objetivo geral do presente artigo foi analisar o papel da educação enquanto pré-requisito para atuação no processo de mediação, buscando a resolução dos conflitos sociais, como fator de integração da cultura e identidade do território vivido, assim como a formação dos jovens universitários na condução de um mundo pacificado por essa justiça negociada, por meio da mediação. O problema que se levantou na presente pesquisa diz respeito ao conhecimento mais exato do que é necessário na implementação da prática da educação de forma a preparar mediadores, seja em termos de impactos positivo como de limitações, por meio dos cursos de Direito, para se pensar em como formar as novas gerações para serem indutoras desse processo? O presente estudo contou com pesquisa bibliográfica. Com base na educação e no cultivo do sonho de uma sociedade mais pacífica e sustentável, pensa-se em uma universidade salesiana que possa contribuir no cuidado com os jovens que farão uso da mediação no futuro, num processo dialogado entre as coletividades locais e o Estado Nacional. 

Palavras-Chave: Desenvolvimento Local. Mediação. Empoderamento. Formação. Educação. 

Abstract: The present work is part of the doctoral thesis entitled “Mediation and education as a resource for empowerment and social pacification for local development” and deals with mediation, education, empowerment and local development. The general objective of this article was to analyze the role of education as a prerequisite for action in the mediation process, seeking the resolution of social conflicts, as a factor of integration of the culture and identity of the lived territory, as well as the training of university students in the conducting a world pacified by this negotiated justice, through mediation. The problem that arose in the present research concerns the more accurate knowledge of what is necessary in the implementation of the practice of education in order to prepare mediators, either in terms of positive impacts or in terms of limitations, through the courses of law, to think how to form the new generations to be inducers of this process? The present study included bibliographical research. On the basis of education and the cultivation of a dream of a more peaceful and sustainable society, we believe in a Salesian university that can contribute to the care of young people who will make use of mediation in the future, in a process of dialogue between local communities and the State National. 

Key words: Local Development. Mediation. Empowerment. Training. Education. 

1. INTRODUÇÃO

 

A presente pesquisa teve como temática o uso da educação como pré-requisito para a atuação no processo de mediação frente à atual problemática da sociedade brasileira. A temática foi abordada sob duas perspectivas convergentes, isto é, a do desenvolvimento local e a da educação. A partir dessa convergência tornou-se possível discorrer sobre duas questões assaz importantes, isto é, o empoderamento e a pacificação social.  

A questão pode ser entendida em termos progressivos. Em outras palavras, o desenvolvimento e o desenvolvimento local possuem uma relação próxima. O processo educacional, quando metabolizado nesta perspectiva, passa a ser um importante meio capaz de empoderar o indivíduo, a sociedade, os agentes de desenvolvimento e os agentes institucionais e sociais, como um todo, em vista do princípio teleológico de produzir uma profilaxia efetiva da sociedade, levando-a à pacificação social. 

A própria temática abordada ilumina as justificativas da pesquisa nos âmbitos social, acadêmico e pessoal. Em relação à sociedade, a pesquisa se justifica pelo fato de a mediação se constituir num processo inserido no âmbito das coletividades locais. Por si só, a mediação é um recurso de um tipo de justiça negociada, com base em critérios que levam em conta a cultura dos indivíduos dentro dos contextos próprios dos territórios vividos. Isso possibilita às partes implicadas encontrar os meios de efetivá-la.  

A escolha dessa temática como foco da presente pesquisa explica-se, em grande parte, pela formação da pesquisadora no Direito e sua atuação como conciliadora/mediadora judicial do Poder Judiciário de Mato Grosso do Sul. As observações advenientes da experiência como mediadora fizeram com que a pesquisadora se preocupasse com a formação de profissionais, em especial do direito, capazes de contribuir para a promoção da autonomia individual e coletiva em vista da pacificação social, sempre levando em consideração o diálogo necessário com as regras da Justiça do Estado Nacional.  

O problema que se levantou para a pesquisa diz respeito ao conhecimento do que é necessário para a implementação da prática da educação, de forma a preparar mediadores, seja em termos de impactos positivo como de limitações, por meio dos cursos de Direito, para se pensar em como formar as novas gerações para serem indutoras desse processo. 

O objetivo da pesquisa foi investigar, na perspectiva do desenvolvimento local, o papel da educação como pré-requisito para a atuação no processo de mediação e como tal a mediação, plusificada pela educação, se transforma em fator de integração da cultura e identidade no território vivido. A formação de jovens universitários mobilizados e comprometidos com a sociedade, usando a negociação promovida pela justiça, tornará possível a pacificação social. 

O presente estudo contou, inicialmente, com pesquisa bibliográfica. Os dados favoreceram o aprofundamento dos conceitos previamente selecionados no referencial teórico e metodológico.  

Quanto à organização, além da introdução e das considerações finais, este artigo possui um tópico, no qual se discutiu a importância da educação para a promoção do desenvolvimento local e a inserção da mediação enquanto recurso da comunidade para o empoderamento, a formação e a qualificação dos indivíduos. Nesse item, portanto, foi possível apresentar as convergências entre a mediação e o desenvolvimento local, iluminado pela educação, para a construção das bases para o empoderamento social. 

 

2.EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO LOCAL VIA MEDIAÇÃO 

 

No presente tópico discutem-se a importância da educação para a promoção do desenvolvimento local e a inserção da mediação enquanto recurso da comunidade para o empoderamento, a formação e qualificação dos indivíduos.  

 

 

2.1.Educação, mediação e a promoção do desenvolvimento local 

 

A educação é uma dimensão fundamental para o desenvolvimento local. Em certo sentido, é a educação que vai conduzir o indivíduo à formação necessária ao seu próprio desenvolvimento intelectual, moral, social e racional. Conforme Ávila (2000, p. 63),  

 

[…] formação e educação andam sempre juntas, entrelaçadas, mas têm sentidos próprios […]. Etimologicamente, o termo “educar” vem de educare em latim, com a raiz comum de educere, em que e (= de, procedência) + ducere (= guiar, levar, conduzir) + ad (= “para”, indicando complemento de direção). 

 

O resultado desse desenvolvimento, isto é, dessa formação, é que possibilitará uma transfiguração relacional da comunidade na qual esse indivíduo está inserido. Se for reflexiva e crítica, a educação irá permitir ao indivíduo transcender-se, ou seja, descobrir que tipo de comunidade auspicia, e atuar, não como um simples ator, mas como um agente social relevante. O princípio teleológico que guia o indivíduo e a comunidade é o de que ela mesma pode promover o próprio desenvolvimento, tendo como base o aproveitamento do tecido humano, de sua capacidade inventiva e da união de suas forças locais, ou seja, o desenvolvimento local, vindo de dentro para fora. Para Ávila (2000, p. 74),  

 

[…] trabalhar para que as próprias comunidades conheçam o que são e o que têm e, com base nisso e em sua capacidade metabolizadora de fatores externos, se desenvolvam “de dentro para fora” (isto é, assumam as rédeas de seus destinos comuns), implica radical metamorfose de nossa secular cultura desenvolvimentista: requer clareza de intenções, coragem de “remar contra a maré” políticoeconômica mundialmente vigente e, sobretudo, perspicácia, pertinácia, competência e habilidades de influir sem impingir, de ajudar sem forçar e, enfim, de “contaminar a comunidade” para que paulatina e processualmente conquiste a capacidade da permanente construção do autodesenvolvimento.  

 

Nessa acepção a formação educacional possibilitará o empowerment, ou seja, o empoderamento do indivíduo. Por empoderar aqui se entende a capacidade de autodeterminação do indivíduo. Uma pessoa empoderada possui voz ativa na busca da solução dos seus problemas e da satisfação de suas necessidades, além de buscar saídas para a melhoria de sua própria vida e ou da comunidade. Em suma, a principal característica do empoderamento é o fato de que o indivíduo passa agir com autoridade própria. O empoderamento torna o indivíduo senhor de si mesmo sem prejuízo dos outros membros da comunidade, conforme afirma Gohn (2004, p. 23): 

 

O “empoderamento” da comunidade, para que ela seja protagonista de sua própria história tem sido um termo que entrou para o jargão das políticas públicas e dos analistas, neste novo milênio. Trata-se de processos que tenham a capacidade de gerar processos de desenvolvimento autossustentável, com a mediação de agentes externos- os novos educadores sociais – atores fundamentais na organização e o desenvolvimento dos projetos.  

 

Destaca-se que o sentido de empowerment traduzido no Brasil pode se referir ao processo de sensibilização e aos saberes destinados à promoção e a estimulação de grupos e comunidades, na acepção de seu crescimento, de sua autonomia e da melhora gradual e progressiva de suas vidas, tanto material quanto espiritual, guarnecidos de entendimento crítico e reflexivo da realidade social. Pode se referir também às ações de integração dos excluídos, carentes e requerentes de bens elementares à sobrevivência, de serviços públicos e de atenção pessoal, entre outros, em sistemas débeis, que não cooperam para organizá-los porque não os consideram como comunidade, como grupo de pessoas, mas sim individualmente, compondo um círculo eterno de projetos de ações sociais assistenciais (GOHN, 2004).  

Para Gohn (2004), ainda, os principais elementos diferenciadores, dentre tantos outros, desses dois tipos de processos e de seus resultados, são a natureza, o caráter e o sentido do projeto social da(s) instituição(ões) que promove(m) o processo de intervenção social, a exemplo dos mediadores. Dessa forma, a mediação exercida na escola também é considerada como promotora do empoderamento do indivíduo. Esta lhe oportuniza conhecimentos para o desenvolvimento de sua consciência crítica e reflexiva a ponto de levá-lo a autodeterminar-se, ou seja, a representar-se a si mesmo, pois se reconhece senhor do próprio destino sem prejuízo do seu semelhante e da comunidade.  

O indivíduo, ao ingressar na escola, carrega consigo toda a cultura de sua comunidade, suas crenças e valores, transmitidos, muitas vezes, de geração em geração. A educação é o aparato social usado para amalgamar a experiência pessoal com a social por meio da promoção do conhecimento humano, histórico, político, religioso e cultural, entre outros, em vista de sua transfiguração em ser humano plusificado (WANDERLEY; BORGES, 2019). Ressalta-se que a educação aqui é entendida como aquela voltada à consciência crítica, a formação voltada para o desenvolvimento local (ÁVILA, 2000). Entretanto, a educação, em especial a ofertada neste fim da segunda década do século XXI no Brasil, não é suficiente para levar à promoção desse desenvolvimento. 

Oliveira (2002) afirma que a sala de aula, entendida como espaço exclusivo onde se dá o processo de ensino-aprendizagem, apresenta limitações consideráveis. Na opinião de Coutinho, Porto e Silva (2016, p. 29), tal processo se dá, frequentemente, por meio da transmissão vertical de informações. No fluxo professor-estudante, este possui quase sempre um papel passivo e estanque, como que dissociado da vida e das prioridades estatais, sociais e locais. 

A construção dos conhecimentos necessários para a aquisição das competências almejadas para os estudantes passa, inevitavelmente, pela mudança desse quadro, de maneira a engajá-lo como elemento ativo, crítico e autônomo. Para Oliveira (2002), o discente não pode ser apenas o captador indiferente de conteúdo, mas o construtor do próprio destino, mediante o aprendizado. O estudante precisa saber que o que está em jogo é a dependência social e a dominação política. Por isto a educação se torna um meio mediante o qual ele passa a gerir o próprio destino na realidade em que vive. Trata-se, portanto, de um movimento endógeno do desenvolvimento local. A esse movimento Martins e Borges (2018) denominam como desenvolvimento local horizontalizado. Segundo Ávila (2000, p. 

70),  

 

[…] os fatores endógenos do desenvolvimento local se constituem daqueles potenciais, dinamismos e forças tanto individuais, familiares e coletivos quanto físico-ambientais presentes explícita ou implicitamente no cotidiano de cada comunidade localizada. 

 

A aquisição de competências torna-se um processo contínuo e múltiplo, em suas fontes, em suas vias de acesso, em suas formas. Para Oliveira (2008, p. 25-

26),  

O professor, mais que uma fonte absoluta de saber e ciência, transforma-se no incentivador da aprendizagem, na sala de aula e além dela. Além de dominar os conteúdos que pretende ensinar, o docente precisa promover a interação entre os participantes do processo e indicar meios para a aproximação, por parte deles, das fontes nas quais podem encontrar os subsídios necessários para a construção do conhecimento. Conhecimento este, aliás, em constante mudança, para além de qualquer conceito de estabilidade; dinâmico, ágil, permanentemente reconfigurado e reconstruído, disponível em uma multiplicidade de meios e fontes, num contexto de mediação tecnológica, jamais visto anteriormente, em termos históricos. Então, para mudar, a “sala de aula” precisa ser um espaço que transcende os limites institucionais. 

 

Conforme Oliveira (2002), um autêntico universo oceânico de informações alimenta o fluxo incessante de construções possíveis de novos saberes, de reorganização de velhas certezas, que se transforma em novas perguntas, que buscam e estruturam ainda outras informações, que se conectam a ideias semelhantes em novos campos de conhecimento, reestruturando os paradigmas e impondo uma relação diferente entre os objetos de estudo e aqueles que pretendem apreender sua estrutura e propriedades. Para Gohn (2004, p. 24),  

 

Neste cenário, de novos temas, problemas e conceitos (ou de ressignificações disso tudo), resulta que, com as mudanças da conjuntura política na economia globalizada, o perfil e caráter da formação dos agentes mediadores ou educadores (as) sociais se alterou. O novo educador deve ter outras qualificações além da militância. Para poder conhecer seus educandos, suas culturas, linguagens, valores e expectativas na vida, ele deve conhecer também a comunidade onde atua, ser sensível aos seus problemas. Para isso ele tem que dominar alguns conhecimentos. O educador tem que se formar e ser informado, não apenas na relação dialógica, mas em cursos de formação específica, combinados com cursos de formação geral (por isto os programas de pós-graduação estão repletos de educadores advindos das ONGs. 

 

Para Oliveira (2002), essa relação é a da incerteza, da incompletude, do “mais por fazer” e da impressão de que é preciso atualizar sempre, acompanhar o movimento incessante, rápido, intenso, multifocal, multimídia. É a isso que Wanderley e Borges (2019) denominam como plusificacão. Informar-se mais não necessariamente significa conhecer mais, mas pode significar adquirir elementos para a construção do conhecimento, para não correr o risco de usar, para as reflexões da ciência e da produção, suposições descartadas, como comprovadamente falsas, ou manter como proposição unicamente aquilo que já é certeza. 

Kenski (1998) afirma que o saber concreto e imóvel não existe. O conhecimento possui uma característica bem peculiar, que é a constante renovação de conceitos. Vinculado aos acontecimentos do dia a dia, o conhecimento se recria e se transforma, oportunizando novos aprendizados, vinculados às ações humanas. No caso do desenvolvimento local a própria comunidade passa a engendrar o seu destino trabalhando o conhecimento contributivo de quaisquer agentes externos, assumindo a gestão do próprio desenvolvimento. Para Ávila (2000, p. 69), “[…] sob todos os pontos de vista (social, econômico, cultural, etc.), inclusive, no que se refere à contínua atração e metabolização de contribuições exógenas alimentadoras”. 

Schön (1995) entende que o aprender a aprender alude à necessidade de autoperceber-se como ser incompleto, isto é, em constante transformação. Assim, o papel de possuidor do conhecimento, ostentado pelos professores na pedagogia tradicional, se transfigura a ponto de surgir o professor mediador, cuja posição é a de aprendente, compartilhador, colaborador, fomentador da autoria e da coautoria. Para Mercado (1998), o professor tem uma função recriadora metódica, sendo essa a única forma de proceder quando se tem discentes e contextos de ensino com características tão variadas, como sucede em todos os níveis de ensino. Morgado (2009) completa afirmando que sua função é a da criação e recriação sistemática, considerando o contexto em que se desenvolve a sua atividade e a população-alvo desta atividade, isto é, o professor e o discente. Trata-se do papel de mediador de conhecimento, a mediação pedagógica. 

O mediador promove a construção do capital social e humano no campo da educação, pois auxilia no desenvolvimento das capacidades, das relações individuais e coletivas e das relações de autoajuda, de modo que os indivíduos possam realizar um processo de transcendência em relação à situação em que vivem e o tipo de sociedade que almejam, em especial quando o que está em jogo são problemas comuns que afetam as relações sociais e a qualidade de vida. Para Baquero e Baquero (2005, p. 82),  

 

Produzir capital social no âmbito da educação envolve, entre outros, […], o engajamento dos processos educativos, escolarizados ou não, na comunidade, com a perspectiva de produzir soluções ou produtos tangíveis e desenvolver aprendizados e valores civis que vão na direção de uma cultura menos individualista e mais comprometida com o bem comum. 

 

O professor poderá favorecer o estabelecimento de uma relação mais aberta com a turma, fortalecendo os vínculos e promovendo a troca de experiências no ambiente escolar. Por meio desse processo, os sujeitos da práxis educativa poderão se transcender e dar início a uma relação positiva para a construção do conhecimento, buscando o seu significado. Para Libâneo (2009, p. 3), 

 

O professor põe-se como mediador entre o aluno e os objetos de estudo, enquanto os alunos estabelecem com o conhecimento uma relação de estudo. A par disso, professores e discentes estão implicados numa relação social que se materializa na sala de aula, mas, também, na dinâmica das relações internas que ocorre na escola em suas práticas organizativas. 

 

A mediação pedagógica é compreendida por Machado (2009) como a ação de intervenção no aprendizado do sujeito, seja presencial ou on-line, cuja efetivação é feita pelo professor, por meio de símbolos e de ferramentas acessórias, que vão dirigir discentes e professores na prática educativa. O professor, então, é o mediador, que está entre o conhecimento e o discente. É ele quem, por meio de livros, artigos, jogos ou outros meios, transmitirá ao discente os conhecimentos necessários para a aquisição do aprendizado de determinada disciplina ou conteúdo. Porém a mediação não é somente a transmissão de determinado conteúdo. Ela é a facilitação do aprendizado, tornando o conhecimento simples e de fácil entendimento ao discente, de forma que este possa compreendê-lo e apreendêlo, por meio de uma aprendizagem baseada em problemas, possa aperfeiçoar seu senso crítico, descobrindo em si mesmo o poder de lutar pelo que necessita ao próprio desenvolvimento. Para Guedes (2014, p. 26),  

 

A Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) ou PBL (Problembased learning) originou-se na Escola de Medicina da Universidade McMaster, no Canadá, no final dos anos 60. Ela é uma metodologia de ensino e aprendizagem, muito utilizada no ensino superior, que emprega problemas da vida real (reais ou simulados) para que o estudante possa aprender por meio da dúvida, deixando de lado o papel de receptor e tornando-se construtor do próprio conhecimento. A PBL pode ser considerada uma metodologia que utiliza situações complexas para instigar os estudantes a pesquisarem soluções para problemas. Ela baseia-se no princípio do uso de problemas como ponto inicial para aquisição do conhecimento, situando a aprendizagem em problemas cotidianos, reforçando o aprendizado já existente.  

 

O professor não deixa de lado as experiências que os discentes trazem de seu cotidiano. Pelo contrário, é a partir delas que o professor plusifica o conhecimento tornando-o mais elaborado e científico, pelo uso de sua influência afetiva e emocional para permitir que o discente assimile o conhecimento e seja capaz de questionar, de buscar, de pensar e de usar a razão para solução de problemas do cotidiano e da melhoria da qualidade de vida. É preciso que o professor se coloque a caminho com o discente e esteja aberto à riqueza da exploração, da descoberta de que ele, o professor, também pode aprender com o discente (MACHADO, 2009). 

Para Mercado (1998), a formação de educadores sinaliza para uma organização curricular inovadora que, ao ultrapassar a forma tradicional de organização curricular, estabelece novas relações entre a teoria e a prática. Oferece condições para a emergência do trabalho coletivo e interdisciplinar e possibilita a aquisição de uma competência técnica e política que permita ao educador se situar criticamente no novo espaço educacional. Para Baquero e Baquero (2005, p. 83), 

 

Um processo de formação humana enfatizando valores que visem ao bem da comunidade, a partir de valores importantes para a coletividade, são tarefas inadiáveis tanto para a prática educativa quanto para a prática política. Nesta perspectiva, a relação educação e democracia assume características peculiares, constituindo-se o capital social como instância mediadora nesse processo de formação. 

 

Ao mediador da educação cabe o papel de estar engajado no processo pedagógico. Ele é consciente não só das reais capacidades dos discentes, do seu potencial e de suas limitações, para que possam ser exploradas num determinado conteúdo, mas também contribuindo para a melhoria do processo ensinoaprendizagem. Dessa forma, por meio de uma renovação da prática pedagógica do professor e da transformação do discente em sujeito ativo na construção do seu conhecimento, leva-o, por meio da apropriação desta nova linguagem, a se inserir num modelo de vida adequado ao que se vive atualmente. Para Dowbor (2009, p. 25), 

 

A educação não pode se limitar a constituir para cada aluno um tipo de estoque básico de conhecimentos. As pessoas que convivem num território têm de passar a conhecer os problemas comuns, as alternativas, os potenciais. A escola passa assim a ser uma articuladora entre as necessidades do desenvolvimento local e os conhecimentos correspondentes. Não se trata de uma diferenciação discriminadora, do tipo “escola pobre para pobres”; trata-se de uma educação mais emancipadora na medida em que assegura ao jovem os instrumentos de intervenção sobre a realidade que é a sua. 

 

A mediação, portanto, vai muito além de mediar conflitos. Ela pode promover o diálogo entre conhecimento, aprendizado das próprias capacidades, diálogo e sociabilização, empoderando pessoas, grupos e comunidade, para a descoberta da plenitude pessoal. Segundo Guillaume-Hofnun (2012, p. 446),  

 

A ética da comunicação e seus corolários – ética da discussão e ética da deliberação – oferece à mediação um fundamento mais interessante que o conflito em si. Pode existir mediação sem conflito, pela necessidade imperiosa de diálogo, por humanidade ou, simplesmente, por um fator social. A mediação se refere, também, a Habermas, que dá um grande espaço à “ética do discurso” e se recusa a fazer oposição à autoridade, pois a discussão não enfraquece a autoridade, ela pode até torná-la eficaz  

 

Para formar mediadores é preciso mudar o ensino e inserir no currículo conteúdos que não necessariamente se ensinam nas escolas, a exemplo da ética e das técnicas de comunicação social. A aprendizagem, assim, deve ser baseada em experiências vitais. Para Muniz (2006, p. 259), 

 

[…] a atuação do mediador institucional exige uma formação aprofundada, regulamentação e organização próprias, pois, falta à maioria dos profissionais, a quem se quer atribuir a função, conhecimento interdisciplinar com informações sobre postura, psicologia, comportamento, sociologia, que os aproxime da sociedade e dos problemas das partes, conteúdos estes que não são ministrados nas escolas, nas faculdades ou nas pós-graduações, mas que tratam do perfil desejado ao terceiro mediador, fazendo com que tenha os pés no chão e a cabeça nos mediados. 

 

A empatia é uma das qualidades mais citadas como eficaz ao mediador. Trata-se da facilidade em pressentir e entender sentimentos e emoções de outras pessoas, de forma sensível e apurada, percebida por meio de como expressões faciais, tom de voz e postura corporal (ZIMERMAN; OSÓRIO, 1997; SIQUEIRA; BARBOSA; ALVES, 1999; QUEIROZ; NERI, 2005). Essa qualidade facilita o trabalho do mediador, pois sua função é agilizar a comunicação interpessoal, de forma pacífica e produtiva. Explica Müller (2008 p. 113) que  

 

Seu conceito, segundo Falconi, abrange três componentes: a) um componente cognitivo, que é a capacidade de inferir com precisão o estado subjetivo de alguém; b) um componente afetivo, caracterizado por um sentimento genuíno de compaixão e de interesse pela outra pessoa; c) um componente comportamental, que consiste nas expressões, verbal e não verbal, da compreensão acerca do estado do outro. 

 

O profissional que atua na mediação não tem formação acadêmica específica. Não existe nas licenciaturas a preocupação com a ênfase na mediação e no ensino ou disciplinas que contemplem essa formação. Além do mais, são poucas as discussões em torno da formação do mediador, mesmo porque se trata de algo recente. Formar o mediador é estimular a reflexão, a crítica e o aprendizado mais amplo para lidar com as pessoas e os seus problemas, ou, até mesmo, para ensinar. Contudo, se não partir da realidade de uma especificidade diferenciada, a formação não se engendrará um profissional que terá competências e saberes necessários à prática fundamentais da mediação.  

Considera-se que a formação profissional tem como finalidade a construção de capacidades necessárias a um profissional que pensa sobre a sua prática, que tem a consciência de seu papel, que toma decisões em busca da construção de sua autonomia e dos conhecimentos necessários para o avanço qualitativo da solução de conflitos. Explica Müller (2008, p. 114) que, 

 

Dado que a profissão do mediador é nova e exercida por profissionais advindos de distintas áreas, não é possível dizer que exista um melhor mediador, apenas que, o facilitador deve estar capacitado para lidar com conflitos que envolvam aspectos emocionais. O perfil profissional do mediador em mediação deve incluir nível superior; capacidade básica em mediação; experiência no emprego de técnicas de resolução de conflitos e credibilidade das partes. Além disso, o mediador deve ser um favorecedor da cooperação; facilitador da comunicação, da troca de informações e do entendimento e, ainda, um equilibrador. […] o mediador de conflitos necessita integrar conhecimentos de distintas áreas para responder às exigências singulares de sua atuação, às demandas sociais e de mercado de trabalho. 

 

Uma política adequada de desenvolvimento local tem como base a formação humana, social, política e educacional da comunidade e, para tanto, o professor mediador possui a principal função, que é a de mediar o conhecimento e promover o empoderamento dessa comunidade como um todo, para que seus membros acreditem em si mesmos e se transfigurem em senhores do próprio destino. Destacam Pike, Rodríguez-Pose e Tomaney (2006) que educação e habilidades fracas ou deficientes entre pessoas e comunidades tornaram-se a principal barreira para o desenvolvimento bem-sucedido:  

 

There are multiple and variable reasons for the failure of traditional local and regional development policies. Some of them are external to the design and implementation of the policies. In some areas, weak or deficient education and skills among people and communities became the main barrier for successful development. In others, weak local economic structures have jeopardised policy efforts towards development. Poorly suited social and institutional contexts have also been highlighted as possible reasons for the poor performance of traditional development policies […]. (PIKE; RODRÍGUEZ-POSE; TOMANEY 2006, p. 14). 

 

As estratégias de desenvolvimento local e regional geralmente são estruturadas em torno de um esquema triplo que abrange o desenvolvimento de hardware econômico, software e orgware, “[…] a melhoria da capacidade organizacional e institucional para projetar, implementar e monitorar toda a estratégia de desenvolvimento” (BARQUERO, 2007, p. 183).  

O desenvolvimento do orgware vai além de uma simples coordenação vertical e horizontal de diferentes âmbitos de governo e de agentes públicos e privados locais e levanta questões importantes de governança que precisam ser abordadas por instituições comuns (HAUSWIRTH; HERRSCHEL; NEWMAN, 2003).  

O desenvolvimento do hardware envolve muitos fatores comuns às políticas de desenvolvimento tradicionais, como a provisão de infraestrutura básica, incluindo o estabelecimento de redes de comunicação e de espaços industriais e a infraestrutura para o desenvolvimento do capital humano (incluindo educação, saúde e instalações culturais) (BARQUERO, 2007). Entende-se, portanto, que o desenvolvimento local se faz com o acesso à educação e que tenha o mínimo de infraestrutura de comunicação, de local adequado e de pessoas que ajudem a comunidade no reconhecimento de suas capacidades, unindo esforços em comum para o crescimento de todos. 

Não se pode pensar o desenvolvimento local sem que haja um educador, um mediador de conhecimentos. É ele quem propiciará o saber necessário ao desenvolvimento da consciência crítica, da capacidade de refletir sobre a realidade e sobre a existência de recursos que se possa aproveitar, da necessidade da união de forças de cada um dentro da comunidade, das políticas públicas necessárias ao uso desses recursos e, ainda, do empoderamento de cada participante e seu papel no desenvolvimento local. Tudo isso pode resultar em uma comunidade que ruma ao progresso tendo a base forte da mediação em educação como alicerce de suas ações e políticas.  

Ressalta-se que, o desenvolvimento local é um meio efetivo para a construção da democracia, procedimento por meio do qual se usa uma diversidade de experiências pela necessidade de se romper com a lógica centralizadora da globalização para que prevaleça uma lógica que considere as forças locais (MARQUES; BROSTOLIN, 2012). 

Significa isso que cada lugar tem suas especificidades, cultura, crenças, meios de produção, sendo considerado, portanto, diferente de outros locais, ou seja, cada local é único e deve ser considerado como tal, no sentido de se pensar políticas de desenvolvimento, tal como educação, saúde e trabalho, entre outros. Por exemplo, assim como a educação em Mato Grosso do Sul, na disciplina de Geografia, deve considerar as características do solo desse Estado, os meios de produção, sua história, desenvolvimento, economia, entre outros aspectos – e assim deve suceder com outras disciplinas, como a História, por exemplo, que devem incluir aspectos históricos do Estado em questão –, outros Estados da Federação também devem ensinar suas especificidades. Em outras palavras, cada local ou cada região deve ser considerada como particular, como especial, em questão de política de desenvolvimento.  

Para Marques e Brostolin (2012, p. 10), “[…] la educación no puede ser encarada sólo como medio transmisor de cultura alienada, solo que debe estar comprometida con la vida, con la existencia y constituir una fuente de promoción del individuo en la sociedade”. 

O desenvolvimento local considera, portanto, as forças locais e a produção local. Esses meios podem ser explorados pela comunidade e irão lhe render frutos. Além destas, as possibilidades de aprimoramento dessa comunidade também devem ser levadas em consideração pela dimensão educacional, que precisa ser voltada para esses aspectos, de modo a empoderar essas pessoas, para que elas consigam compreender a força que possuem quando unidas em vista de um ideal de desenvolvimento. De acordo com Hevia (2003, p. 24), 

 

En el contexto de lo local, las estrategias de desarrollo deben ser conceptualizadas de una manera más integral, incorporando las dimensiones relacionadas con el mundo social de lo comunitario, la evolución social de un grupo humano reflejada en su historia y sus símbolos culturales. Hay que comprender que el crecimiento económico constituye sólo otra dimensión a insertarse en la dinámica de una población local. 

 

Com esse desenvolvimento vêm a melhoria da qualidade de vida, melhor educação, mais saúde e mais bem-estar para essa comunidade, pois pessoas mais felizes e realizadas produzem melhor e vivem melhor. Todavia, para se pensar no desenvolvimento local dessa maneira, é preciso pensar em educar e em mediar conhecimento. Este é um aspecto fundamental. Para Marques e Brostolin (2011, p. 

17),  

 

[…] el sentido teleológico de la educación, es decir el desarrollo pleno de la persona, la preparación para el ejercicio de la ciudadanía y la calificación para el trabajo. En el sentido legal indicado, la escuela debe preocuparse por el ser humano, independientemente de la familia, clase, o religión a la que pertenezca. Para eso, deberá desarrollar y revelar en cada uno, sus dotes innatas, sus valores intrínsecos, sus aptitudes, talentos y vocaciones, para que el individuo pueda ascender socialmente. 

 

A mediação, portanto, serve como apoio ao desenvolvimento local em sua base, pois mediará conhecimento sobre o local, suas características, sua economia, seus meios de produção, sua geografia, sua história, sua língua, sua matemática e sua ciência, de modo que as pessoas envolvidas possam conhecer melhor o lugar onde vivem e saber como poderão explorar melhor suas potencialidades. Dessa maneira, os indivíduos passam a perceber que o local tem muito a lhes oferecer. Assim ampliam a produção e melhoram as próprias relações. Nesse sentido, mediar conhecimento, mediar diálogos produtivos, mediar conflitos que impedem a produção e o desenvolvimento, mediar ideias e ideais, mediar possiblidades, mediar união entre pessoas, mediar empoderamento é o objetivo da Mediação. 

O papel da Mediação no empoderamento e na educação é fundamental. É por meio de uma educação reflexiva e crítica que as pessoas são empoderadas. É preciso dar voz às pessoas, despertá-las na sua capacidade de expressar, de expor ideias, de debater, discutir e de buscar condições para o seu desenvolvimento, em todos os âmbitos de sua vida.  

A mediação pode promover esse tipo de educação reflexiva e crítica. Seu papel é o de oportunizar aos indivíduos acesso ao conhecimento, fazendo com que as pessoas pensem por si só sobre determinado assunto e busquem a solução para os problemas que as afetam em suas relações sociais. Entretanto educar para atuar na mediação requer que se considerem aptidões essenciais, como a capacidade para dialogar, de saber se expressar com clareza, de autocontrole das emoções, de persuasão, de ser prudente e de ter raciocínio rápido em vista da solução de problemas que possam surgir em meio ao diálogo e ser paciente e ético. É preciso que também que as instituições de ensino se concentrem em desenvolver essas aptidões nos discentes, quando se considerar um curso de capacitação voltado para a mediação,  

 

Apunta la tendencia de la educación a ser utilizada como un medio para diferenciar los individuos y reproducir las iniquidades. Pero, a pesar de eso, muestra el camino para el cambio, o sea, la utilización de la educación como un instrumento de equilibrio por medio de la adopción de métodos educativos apropiados para realizar esa transformación (MARQUES; BROSTOLIN, 2011, p. 18). 

 

Conforme Gadotti (2000), a perspectiva atual do ensino consiste em uma educação voltada para a solidariedade e a reciprocidade. Essa perspectiva é mais voltada para a transformação social do que para a transmissão cultural, visto que essa instrução é voltada à transformação da pessoa, enquanto ser humano e ela dever ser contínua. Todavia a educação precisa levar em consideração a participação de toda a comunidade, que deve se organizar para integrar os espaços sociais, de modo a integrar o educando na sociedade do conhecimento. Para 

Gadotti, 2000, p. 6), ainda,  

 

As práticas de educação popular também se constituem em mecanismos de democratização, em que se refletem os valores de solidariedade e de reciprocidade e novas formas alternativas de produção e de consumo, sobretudo as práticas de educação popular comunitária, muitas delas voluntárias. 

 

Na atualidade, aprender vai além de reciclar, de atualizar e de assimilar conhecimentos. Há múltiplas oportunidades de aprendizagem, como as parcerias entre o público e o privado (família, empresa e associações, entre outras), as avaliações permanentes, o debate público, a autonomia da escola e a generalização da inovação. As implicações para a escola e para a educação em geral são muitas. As instituições de ensino precisam ensinar o estudante a pensar, a saber comunicar-se, a saber pesquisar, a ter raciocínio lógico, a fazer sínteses e elaborações teóricas, a saber organizar o próprio trabalho, a ter disciplina para o trabalho, a ser independente e autônomo, a saber articular o conhecimento com a prática e a ser aprendiz autônomo. Nesse contexto, segundo Gadotti (2000, p. 8), o educador é o mediador de conhecimento e o discente é o sujeito da própria formação, “[…] educação tornou-se estratégica para o desenvolvimento, mas, para isso, não basta “modernizá-la”, como querem alguns. Será preciso transformá-la profundamente”. 

O mediador oportuniza a busca pela construção desse conhecimento no discente, desperta-o para a curiosidade e instiga-o à imaginação e à reflexão sobre o cotidiano e o aprendizado teórico, buscando implicações desse para a prática voltada ao desenvolvimento local. Nesse caso, o papel do professor mudou, se transformou. Transcendeu do papel de simples transmissor e dono do saber para se transfigurar em mediador, isto é, naquele que oportuniza ao discente construir conhecimento, que o ajuda a unir a teoria com a prática por meio da reflexão, da crítica, do raciocínio lógico. O professor, portanto, ensina a pensar, a criar, a partir da vivência diária do próprio educando. Dessa forma, o discente tem a oportunidade de transformar o meio em que vive em um lugar melhor. Para Gadotti (2000, p. 8-9), 

 

O que é ser professor hoje? Ser professor hoje é viver intensamente o seu tempo, conviver; é ter consciência e sensibilidade. Não se pode imaginar um futuro para a humanidade sem educadores, assim como não se pode pensar num futuro sem poetas e filósofos. Os educadores, numa visão emancipadora, não só transformam a informação em conhecimento e em consciência crítica, mas também formam pessoas. Diante dos falsos pregadores da palavra, dos marqueteiros, eles são os verdadeiros “amantes da sabedoria”, os filósofos de que nos falava Sócrates. Eles fazem fluir o saber (não o dado, a informação e o puro conhecimento), porque constroem sentido para a vida das pessoas e para a humanidade e buscam, juntos, um mundo mais justo, mas produtivo e mais saudável para todos. Por isso eles são imprescindíveis. 

 

A educação do futuro, para Gadotti (2000), é a preconizada por Delors, isto é, voltada à aprendizagem ao longo da vida, que tem como base quatro pilares: 1) aprender a aprender, ou seja, redescobrir o conhecimento, reconstruir a partir da vida cotidiana, ter curiosidade, a repensar e reinventar a vida; 2) aprender a fazer, que significa trabalhar em comunidade, a colocar em prática o que aprende e teorizar o que pratica, saber se comunicar, resolver conflitos, saber ser flexível; 3) aprender a viver juntos, ou seja, viver em comunidade, onde tudo é para todos e o que todos fazem gera benefícios para toda a comunidade; 4) aprender a ser, que é o desenvolver a pessoa, inteligência, sensibilidade, sentido ético e estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade, pensamento autônomo e crítico, imaginação, criatividade, iniciativa. Tudo isso significa desenvolver o ser humano, enquanto pessoa, indivíduo no coletivo, na comunidade, fortalecer caráter, construir a ética e desenvolver a cidadania em cada um e em todos. Em outras palavras, empoderar. 

Para Caliari, Alencar e Amâncio (2000), a educação precisa transformar, isto é, transcender-se, para conseguir se transfigurar em capacidade crítica do indivíduo, possibilitando-lhe maior participação na comunidade, de forma concreta. Os autores enfatizam a importância de se privilegiar o conhecimento e as necessidades locais e regionais, ligadas à realidade vivida, para promover o desenvolvimento local sustentado mediante o fortalecimento da cidadania e da dignidade humana. Trata-se de uma forma de ensinar que privilegia a interação do discente com o meio em que vive e permite que ele compreenda a realidade que o circunda, ao mesmo tempo em que fomenta a sua criticidade racional de forma a implementar inovações voltadas ao desenvolvimento do local em benefício de toda a comunidade. Caliari, Alencar e Amâncio (2000, p. 13) afirmam que  

 

Uma prática educacional que se pode considerar efetivamente como uma “ação transformadora” propicia as condições para a construção da “pedagogia do compromisso”. Para isso busca formas e meios para envolver-se em momentos básicos de atuação, como o “compromisso com a solidariedade”, em que deve estar comprometida para a edificação de uma nação de cidadãos, compartilhando os ideais para a eliminação da exclusão social e a desigual distribuição da riqueza, da renda, do poder e do acesso ao conhecimento; o “compromisso com o desenvolvimento”, expresso pelo abandono tutorial da lógica do capital financeiro e incentivo ao envolvimento para a ampliação do potencial disponível nas pessoas; o “compromisso com a sustentabilidade”, assumindo-se como multiplicadora na busca um novo estilo de desenvolvimento que não se baseie na cópia de modelos socialmente injustos e ecologicamente inviáveis, mas que tenha uma concreta e atuante preocupação com as gerações futuras; o “compromisso com a democracia” pautado no princípio da participação popular e a efetivação dos sistemas políticos amplamente representativos e notadamente plurais; o “compromisso com a intervenção social”, por meio do qual as políticas públicas estarão condicionadas às necessidades da população onde as mesmas estabelecerão as prioridades e formas de aplicação dos recursos disponibilizados para a realização dos programas. 

 

Mediar o conhecimento e a educação, em comunidades locais, significa desenvolver o potencial de cada pessoa, empoderar, para que ela possa ter mais consciência dos dons que possui, incentivando para que esses dons, aliados às possibilidades de trabalho da comunidade, resultem no próprio desenvolvimento local. Em outros termos, mediar o conhecimento e a educação se torna um exercício de plusificação. É claro que não se pode esquecer que esse desenvolvimento precisa e depende das boas relações interpessoais na comunidade ou na localidade, para que essas pessoas possam se unir, cada uma com sua especificidade e, juntas, promover a operacionalização de atividades econômicas, culturais, educacionais, sociais que farão com que a comunidade possa evoluir em todos os sentidos. A esta evolução é que se dá o nome de transfiguração, pois a comunidade antevê, no aqui e no agora, aquilo que ela precisa ser e se habilita para ser o que precisa ser. Tudo isso resulta em uma estratégia de desenvolvimento local, garantindo a transformação social. Para Albagli (2006, p. 20),  

 

O desenvolvimento local é também considerado endógeno se a comunidade é capaz de dispor de uma estratégia própria e de exercer controle sobre a dinâmica de transformação local, garantindo que o território não seja um mero receptor passivo das estratégias e interesses de organizações externas. 

 

Gadotti (2000) lembra, nesse sentido de transformação social, o que preconizava Paulo Freire sobre a Pedagogia Social, que a educação está voltada para a transformação política e social, visando ao fim da exclusão e da desigualdade. Está direcionada, portanto, para as classes populares (como pedagogia popular e libertadora), inserindo-a, dessa forma, no campo das pedagogias da ação transformadora (GADOTTI, 2012). Essa educação tem por base teleológica transformar, empoderar e conscientizar as pessoas acerca do seu verdadeiro potencial. A educação sozinha não transforma, mas ela pode ser um suporte fundamental para a transformação social, pois tem como base as relações comunitárias. Isto dito em outros termos, significa que a educação é o meio fundamental para fazer com que a comunidade transcenda e se plusifique para se transfigurar naquilo que ela precisa e deve ser. De acordo com Luzuriaga (1960, p. 

3),  

 

A pedagogia social tem por objeto o estudo da educação em suas relações com a sociedade, isto é: a ação dos grupos sociais na formação do homem e a influência da educação na sociedade humana. Com efeito, a educação não é apenas um elemento passivo que recebe os influxos da sociedade, mas também um fato dinâmico que atua na sociedade, reformando-a ou modificando-a. 

 

Essas relações sociais requerem, em especial nas instituições de educação superior, a formação dos acadêmicos de Direito alicerçada nos princípios e nas técnicas da mediação, em vista de transformá-los em pacificadores sociais por excelência. A formação dos acadêmicos de direito, voltada não somente para a mediação de conflitos, mas também para o aperfeiçoamento das relações sociais, requer algumas especificidades. Essas especificidades podem ser no âmbito do oferecimento de disciplinas, como, por exemplo, aquelas voltadas para o trabalho em grupo. Entre elas podem ser citadas a teoria dos conflitos, as técnicas de mediação e negociação, a teoria da comunicação, a teoria dos jogos, os axiomas da comunicação, a comunicação verbal e a não-verbal, a escuta ativa, a comunicação nas pautas de interação e no estudo do inter-relacionamento humano. Além disso devem levar em consideração os aspectos sociológicos e aspectos psicológicos, as premissas conceituais da autocomposição. Nesse caso as disciplinas como um todo devem valorizar o relacionamento interpessoal, promover o conhecimento de como se relacionar e como obter o melhor de um relacionamento, sem prejuízo a qualquer uma das partes. 

 

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS 

 

A mediação não deve ser usada somente para a resolução de conflitos, mas também como recurso de pacificação social e de empoderamento para que os membros de determinada comunidade descubram a sua força e sejam capazes de buscar políticas públicas voltadas ao desenvolvimento local. Este desenvolvimento tem como princípios a garantia de recursos básicos, como o saneamento, a educação, a saúde e a moradia, entre outros, necessários ao incremento da qualidade de vida da comunidade. O procedimento se revela como uma forma de emancipação da sociedade, na busca do aperfeiçoamento das relações sociais. Nesse caso, torna-se fundamental que as partes demonstrem por si o desejo de pacificar a discussão, de modo a contribuir para que os impactos sociais sejam positivos. 

A educação, enquanto pré-requisito para a atuação no processo de mediação, possibilita maior autonomia aos integrantes envolvidos para esse fim. Durante o processo de solução de conflitos são esclarecidos os papéis que cabem às partes litigantes, de modo a propiciar melhoria na postura, quando são incentivados a se sentir mais responsáveis e donos de suas próprias vontades. Trata-se de um processo de ‘empoderamento’ das partes litigantes, como um momento de fortalecimento da autonomia, tanto dos sujeitos quanto da coletividade. 

Alterar as práticas de vivência significa quebrar paradigmas culturais, porquanto estruturas mentais solidamente construídas. No entanto se novas mentalidades podem ser mais facilmente construídas entre os jovens, é necessário repensar o papel das instituições de educação superior nesse sentido, especialmente nos cursos de Direito. A formação dos estudantes de Direito pode se constituir, portanto, em outra modalidade de ação, na medida em que contribui para a transformação dos sujeitos e para a construção de uma nova cultura de pacificação social, que busca na mediação um diálogo negociado como forma de se praticar justiça.  

Essa prática educativa vem sendo repensada na Universidade Católica Dom Bosco, facilitada pelo ideário das instituições salesianas no mundo, em relação à formação dos jovens, pensando-se na construção de um planeta mais justo e sustentável. Esse ideário foi claramente apresentado em 2015, na oportunidade em que a Missão Salesiana participou da Expo Milano, Feira Internacional na Itália.  

A educação do jovem aparece como uma das principais preocupações dos salesianos nesse ideário. Ela deve ser pensada em cada contexto particular, isto é, social, histórico e cultural, de vida desse jovem, de modo a plusificá-lo e habilitá-lo a ser o portador de inovações constantes, frente às transformações aceleradas do mundo e na busca de superação dos problemas nos territórios em que vivem. Nesse sentido, é necessária uma educação que promova o desenvolvimento humano e espiritual, equitativo e sustentável, que tenha como alvo não apenas o jovem, mas a coletividade e o território em que ele vive.  

Para os salesianos, essa educação é possível quando se permite que o jovem cultive um sonho. Isso significa fazer uso de suas forças interiores, isto é, dos conhecimentos, das competências e das habilidades, e espirituais, ou seja, crenças, valores sobre a justiça social e a sustentabilidade, construídas na interatividade de seu mundo vivido, para poder engendrar novas condições de convívio. Inspirada nos ideais de Dom Bosco, para os salesianos, o sonho está além de si mesmo. Serve, portanto, de semente de transcendência e de força de superação. Em outros termos, serve como elemento de transfiguração de uma sociedade que está em constante processo de transcendência, transfiguração e plusificação. 

Com base na educação e no cultivo do sonho de uma sociedade transfigurada em sociedade mais pacífica e sustentável, pensa-se em uma universidade salesiana que possa contribuir no cuidado com os jovens que farão uso da mediação no futuro, num processo dialogado entre as coletividades locais e o Estado Nacional. 

 

 

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______________________ Recebido em 21/02/2019. 

Aceito em 29/08/2019. 

 

 

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