The JUDICIARY’S LEADERSHIP ROLE IN POWER tripartism, BEFORE THE NEW CONSTITUTIONAL ORDER IN FORCE IN BRAZIL

Douglas de Oliveira Santos

RESUMO

O presente artigo tem por finalidade discorrer sobre o modelo tripartite, que passou a ser adotado pelos países ocidentais, a partir da obra de Montesquieu. Nesta linha, será objeto de análise o modelo de tripartição dos poderes, em contraponto ao poder político absolutista, que seria o monopólio do poder político nas mãos do governo absolutista. Nessa linha de perspectiva, serão destacadas as funções institucional e funcional de cada um dos poderes existentes segundo a teoria tripartite, sendo o Poder Judiciário, o Poder Executivo e o Poder Legislativo. Do mesmo modo, o presente artigo se propõe a fazer uma digressão desde o surgimento do modelo de tripartição do poder, quando da disseminação do liberalismo, até o Estado Social, que surgiu com a derrocada do liberalismo. Por outro lado, será abordado o modelo político de poder no Brasil, desde a monarquia até a república, com a adoção do modelo tripartite de divisão do Poder. Dentro do modelo tripartite de divisão do Poder, será destacada a situação e protagonismo do Poder Judiciário em relação aos demais poderes, a partir das funções que lhes foram outorgadas desde que foi estabelecida a nova ordem constitucional vigente no Brasil, para ao final possibilitar uma conclusão acerca do papel atualmente conferido ao Poder Judiciário. 

 

PALAVRAS CHAVE: Tripartição; Poder Judiciário; Brasil.

ABSTRACT

This article aims to discuss the tripartite model, now being adopted by Western countries, from the work of Montesquieu. In this line, it will be analyzed the tripartite model of power, as opposed to the absolutist political power, which would be the monopoly of political power in the hands of absolutist government. In this perspective line will be highlighted the institutional and functional roles of each of the existing powers under the tripartite theory, and the Judiciary, the Executive and the Legislature. Likewise, this article intends to digress from the emergence of tripartite model of power, when the spread of liberalism, to the welfare state, which emerged with the collapse of liberalism. On the other hand, the political model of power will be discussed in Brazil from the monarchy to the republic, with the adoption of tripartite model of division of power. Within the tripartite model of division of power, will highlight the situation and role of the judiciary in relation to other powers, from the functions granted to them since the new current constitutional order was established in Brazil, to the end enable a conclusion about the role currently given to the judiciary.

KEY-WORDS: tripartism; Judicial power; Brazil.

1. INTRODUÇÃO:

O presente artigo através de utilização de pesquisa bibliográfica, possui como fundamento a análise do modelo de tripartição dos poderes desenvolvido por Montesquieu, em sua obra que, ainda nos dias de hoje é utilizado como formato aplicado pelos países ocidentais.

Será destacado este modelo de divisão do Poder Político, que surgiu como um contraponto ao modelo totalitário de concentração do Poder Político nas mãos daquele que exercia, de forma individual e ilimitada, o Poder do Estado, um traço marcante dos absolutistas.

 O desenvolvimento do presente artigo está baseado na ideia de tratar especificamente do surgimento deste modelo de divisão do poder político do Estado, destacando-se cada um dos poderes existentes e o papel funcional e institucional a ser desenvolvido por cada um deles, para que ao final se possa observar a atual situação em que o Poder Judiciário se encontra inserido atualmente no Brasil.

Para isto, se mostra relevante realizar uma análise da divisão do Poder Político no Brasil, desde o período da colônia, quando existia um modelo de divisão política do poder em quatro poderes distintos, contemplando os três poderes destacados na teoria tripartite, mais o poder moderador, que estava nas mãos do Monarca ou de quem por ele fosse designado, para então chegar até o modelo atualmente existente, contemplado na Constituição Federal de 1988.

 E, a partir da divisão do Poder segundo a Constituição Federal de 1988, será verificada a existência de um papel de protagonismo do Poder Judiciário, diante desta nova ordem constitucional, que veio ampliar as funções do Poder Judiciário, delegando a ele o controle de constitucionalidade e a defesa das minorias, dos direitos coletivos, fundamentais e do próprio Estado de Direito.

Assim, a problemática é definir, se a partir desta nova ordem constitucional, o Poder Judiciário passou a exercer uma função de protagonismo, na medida em que, nas atividades que constitucionalmente lhes foram conferidas, ele muitas vezes pode ser instado a interferir na atuação do Poder Legislativo e Executivo, passando a existir uma flexibilização na divisão das funções para com o Judiciário. 

Desse modo, o artigo está dividido em um primeiro capítulo, dedicado a analisar a teoria da tripartição dos poderes desde o período do seu surgimento, segundo a visão de Montesquieu, que deu-se no liberalismo, até o surgimento do estado social.

O segundo capítulo tratará da teoria da tripartição dos poderes no Brasil, abordando a divisão do poder político até o reconhecimento de uma nova ordem constitucional em razão da promulgação da Constituição Federal de 1988.

O terceiro capítulo está dedicado a análise do papel do Poder Judiciário de acordo com o modelo de tripartição do poder, e sua situação atual frente ao modelo constitucional vigente no Brasil.

Ao final, concluir-se-á sobre o papel do Poder Judiciário dentro da divisão do poder político no Brasil, a partir da teoria da tri participação e da nova ordem constitucional.

2. A TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DOS PODERES DESDE O LIBERALISMO ATÉ O ESTADO SOCIAL

Desde as primeiras sociedades reconhecidas, o poder político sempre foi muito debatido, chegando-se ao longo dos séculos a conclusão de que a sua limitação seria relevante para o desenvolvimento das sociedades.

Nesta linha de perspectivas, é relevante ponderar que o conhecido modelo de tripartição do poder, surgiu justamente desta necessidade de limitação do poder político.

Com efeito, é relevante ponderar que este conhecido modelo tripartite de divisão do poder, que na atualidade é traço marcante do sistema político de divisão de poderes nos países ocidentais, foi amplamente difundido, principalmente a partir da tese defendida por Montesquieu, que até os dias de hoje é adotada como base da teoria tripartite.

Por essa razão, mostra-se desnecessária a discussão acerca da existência ou não, de outros escritos anteriores que tenham abordado a mesma sistemática defendida, ainda que por prismas distintos. 

Em relação a tripartição do poder, na visão de Montesquieu, haveria análise dos poderes sobre duas perspectivas distintas, uma de um ponto de vista funcional e outra institucional.

Na primeira visão da tripartição dos poderes haveria o poder legislativo, o poder executivo e o judiciário, o que ocorreria a partir de uma análise funcional.

De outro lado, por uma visão institucional, haveria segundo o autor, o parlamento, o governo e os tribunais.

Sobreleva anotar, que foi Montesquieu o então responsável pela inclusão do Poder Judiciário dentre aqueles fundamentais do Estado, sendo, segundo ele, o Poder responsável por julgar os crimes e conflitos entre os particulares.

Com efeito, embora o Poder Judiciário fizesse parte segundo sua teoria, dos Poderes fundamentais do Estado, não se pode perder de vista que segundo Montesquieu, o Judiciário exerceria um papel secundário, razão pela qual, inclusive é um Poder que surgiu sem amarras aos demais, posição justamente contrária aos Poderes Legislativo e Executivo, que possuem ferramentas para exercer o controle entre si, através do sistema chamado de freios e contrapesos.

Veja-se então, que a partir da obra de Montesquieu, é que restou consolidada a ideia de uma forma de Estado que estivesse desmembrado funcional e institucionalmente em três poderes, dentre os quais, um teria função de legislar, outro a competência de administrar e executar e, um terceiro, encarregado de dirimir conflitos.

Outro ponto que merece relevante destaque, é o fato de que os poderes distribuídos na forma destacada por Montesquieu, deveriam gozar de autonomia e não haveria que se impor prevalência de um sobre o outro, daí surgindo nos países ocidentais que adotaram tal modelo de Estado, a figura do veto presidencial (do executivo) a lei elaborada pelo parlamento (legislativo), e a possibilidade de impitimam do presidente (do executivo) por votação do poder legislativo, no entanto, veja-se que em relação ao Poder Judiciário, não existe nenhum mecanismo de controle. 

Por outro lado, é evidentemente que a separação dos poderes esteve aliada ao ideal liberalista, pois, justamente surgiu como um contraponto a ideia absolutista, que se fundamentava na concentração de poder exclusivamente nas mãos do Estado, ou seja, o poder estaria em um estado absolutista, exclusivamente nas mãos da monarquia e dos que compactuavam com aquela forma de governo.

Assim é que segundo Maurílio Maudonado:

É que a formulação da doutrina da separação dos poderes, como técnica para a limitação do poder, é posta em prática nas Revoluções Liberais Burguesas dos séculos XVII e XVIII – Revolução Gloriosa, Inglaterra 1688/89, Independência Norte-Americana, 1776, e Revolução Francesa, 1789 – em resposta aos abusos e iniqüidades resultantes, entre outros fatores, da concentração de poderes nas mãos do soberano, típica do Absolutismo da Idade Moderna. Vale lembrar que essa era marca o início do Estado de Direito. 

Veja-se, que a teoria da tripartição do poder entre o legislativo, executivo e judiciário, teve como berço o liberalismo que defendia a necessidade de distribuição do Poder do Estado, que outrora, nos governos absolutistas, ficava nas mãos única e exclusiva da monarquia, sendo a divisão dos poderes do estado uma maneira eficaz, segundo a proposta de Montesquieu, de inviabilizar a concentração do Poder nas mãos de um só poder político.

Pois bem, em que pese ter seu surgimento a partir de um modelo liberal, a teoria da tripartição dos poderes manteve-se, mesmo quando do fracasso do modelo em que ela se iniciou.

É que o modelo liberal, com sua marca individualista, passou, a partir do final do século XIX e início do século XX, a não mais se mostrar suficiente para atender as demandas sociais, razão pela qual, o estado de direito foi alvo de profunda modificação, sobretudo após a primeira e a segunda grandes guerras, quando nasceram vários modelos distintos do liberal, dentre eles destacaram-se o fascismo e o socialismo.

  Com efeito, neste momento também surgiu o atual modelo do estado de direito, que inclusive é o que adotado no Brasil, também chamado Estado Social, que implica no reconhecimento do dever do Estado de se ajustar de modo a enfrentar os problemas sociais, transformando a sociedade, no intento de concretizar o bem comum e a justiça social.

A partir do Estado Social, passou a ser atribuição do Poder Estatal garantir a igualdade e assegurar os direitos sociais, além das garantias individuais e a limitação do poder, características que já remontavam o ideal do Estado liberal.

Evidente, que os novos direitos trazidos com a ideia de Estado Social, chamados fundamentais, não se concretizarão mediante uma abstenção do Estado, pelo contrário, a tendência é se demandar cada vez mais do aparato do Estado, para que ocorram prestações positivas em favor da sociedade.

Diante deste novo modelo, a divisão de poderes diante do sistema tripartite sofreu substanciais modificações, na medida em que, se passou a existir uma relativização entre as funções do poder Legislativo e Executivo, no que se refere a atividade normativa, que passou a ser cada vez mais comum entre ambos, mitigando-se a ideia de que somente a lei seria norma, e possibilitando-se, consequentemente, a edição de textos legais pelo Poder Executivo.

Todas essas modificações transformaram a própria concepção do que seria a divisão dos poderes no modelo tripartite.

Isso porque, para além da segurança jurídica, princípio tão caro ao Estado liberal, ganha muita força a ideia de provimento de condições materiais para o adequado e livre desenvolvimento do indivíduo e da proteção de sua dignidade humana e sua condição social.

Em relação ao Poder Judiciário, evidentemente que este ganha relevante notabilidade no modelo de Estado Social, assumindo uma condição de protagonismo, principalmente se levado em consideração que no formato original tratar-se-ia de um Poder Secundário.

Tal situação pode ser verificada a partir da independência que passou a possuir e, da projeção para o triunfo do Estado Democrático e Social de Direito. Notadamente, neste período, a segurança jurídica passou a ter grande notabilidade.

Ademais, ainda em relação ao Poder Judiciário, não se pode perder de vistas que é neste mesmo período, que surge o modelo europeu de controle de constitucionalidade, que coloca sobre as mãos do Poder Judiciário a análise da constitucionalidade das leis elaboradas pelo Poder legislativo e pelo Executivo, já que existe uma mitigação na divisão dos poderes entre ambos.

Por outro lado, ante a essa nova realidade, a atividade de fiscalização do adequado cumprimento constitucional, e o controle dos atos da Administração ganha notabilidade no que se refere ao cumprimento de obrigações essenciais à efetivação de direitos fundamentais, função esta que também acaba por recair sobre a gama de cátedras do Poder Judiciário, nos casos de omissão do Executivo.

3. O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES NO BRASIL 

No Brasil, no período da Monarquia, as constituições do império e as cartas políticas, já dividiam funcionalmente os poderes e suas funções dentro do Estado.

No entanto, não se privilegiava o sistema tripartite, notadamente pelo fato de que a divisão era em quatro poderes, de modo que, para além dos poderes consagrados na teoria da tripartição, havia o acréscimo de um quarto Poder, denominado Moderador, confiado ao imperador ou a quem ele indicava para representar o Poder Executivo.

Evidentemente que era traço marcante desta modalidade de divisão dos poderes do Estado, o desequilíbrio completo da relação entre, na medida em que existia especial prevalência do Poder Executivo exercido pela monarquia sobre todos os demais, principalmente porque a concentração do poder nas mãos da monarquia sempre foi um traço do modelo de governo totalitário, que é instaurado no sistema monarca.

Com efeito, com a queda da monarquia no Brasil, e o consequente surgimento da República, passou a República de imediato a adotar o sistema tripartite de divisão dos poderes.

É o que se evidencia logo da primeira Constituição Republicana, que veio a consagrar expressamente o modelo tradicional de tripartição dos poderes, sendo certo que adotou também o modelo presidencialista dos Estados Unidos como sendo o modelo para o Poder Executivo, e repudiou completamente o sistema monarca de governo, e mantendo-se a independência funcional do Poder Legislativo e do Poder Judiciário.

No entanto, ao longo da república, houve um único período em que o modelo tradicional de tripartição deixou de ser adotado no Brasil em sua essência, e foi justamente entre os anos de 1934 e 1946, quando ocorreu a ditadura de Vargas, momento em que embora existisse a repartição funcional dos poderes, todos eles estavam subordinados a um Poder maior, que representava o Poder Supremo do Presidente da República, que exercia soberania sobre todos os demais Poderes constituídos.

As constituições posteriores ao período da ditadura acima destacado, contudo, mantiveram o mesmo modelo de separação dos poderes, por meio da tripartição, chegando-se até a Constituição Federal de 1988, que foi chamada de Constituição Cidadã, todas elas prevendo a existência de um Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, divididos funcional e institucionalmente.

Com a Constituição de 1988, por sua vez, o Poder político no Brasil viu-se diante de uma importante inovação, especialmente destacada pelo protagonismo do Poder Judiciário e do Ministério Público, que tiveram seu papel alentado na defesa das tanto das tutelas individuais como das coletivas, na manutenção da ordem jurídica, e do modelo democrático do estado de direito.

4. O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NO ESTADO SOCIAL E SUA FUNÇÃO A PARTIR DA NOVA ORDEM CONSTITUCIONAL VIGENTE

De início, é relevante destacar que o Poder Judiciário, antes mesmo da adoção pelo Brasil do sistema de tripartição dos Poderes, quando então passou a se verificar o Poder dos Juízes e das Cortes, sempre foi de relevante importância para o Estado, desde o período do império.

Tal conclusão pode ser extraída facilmente da leitura da obra de Vitor Nunes Leal, denominada o Coronelismo, Enxada e Voto, destacando-se as lições de que no sistema intitulado pelo referido autor como Coronelista, onde esteve ofuscado o regime representativo no Brasil, os juízes e tribunais provincianos sempre tiveram papel relevante para a manutenção do poder nas mãos da monarquia e dos coronéis.

Assim, em que pese ser este poder utilizado como forma de oprimir e não fazer Justiça de uma maneira imparcial e independente, o principal marco da sua condição de protagonismo é a necessidade de o estado absolutista mantê-lo sob sua regência, com fim a perpetuar-se no poder.

Cabe pontuar, que a referida obra destaca de forma minuciosa toda a evolução do poder judiciário no período Monarca, até chegar a República, enfatizando que durante este caminho, o Judiciário acumulou funções desde julgamento de questões que envolvia interesses pessoais, até a de coordenação da Polícia, e era exercido inicialmente por Munícipes locais, passando posteriormente a ser exercido por Juízes designados pelo Império para locais desconhecidos e tinha suas decisões submetidas aos tribunais provincianos e em última instância a própria monarquia.

Conforme já restou destacado acima, muito se galgou até que se chegasse ao modelo atualmente trazido pela Constituição Federal de 1988, que é posterior a edição da obra acima mencionada, e que veio em seu artigo 2° a expressamente destacar a tripartição dos poderes, tal qual o modelo traçado por Montesquieu.

Notadamente, também já foi destacado acima, que o Poder Judiciário passou após a Constituição de 1988, em razão do modelo social adotado, a ser legítimo na defesa de interesses coletivos e individuais fundamentais.

Logo, é daí que o Poder Judiciário, passou a exercer sobre os demais Poderes uma função protagonista na busca pela conservação do equilíbrio no Estado Democrático de Direito, podendo se entender que existe atualmente um controle exercido pelo Poder Judiciário sobre os demais Poderes.

Cabe pontuar, que diante da previsão constitucional e de suas próprias características, o Poder Judiciário adquiriu uma função de controle no combate ao abuso do poder estatal, em razão das ações e das omissões, tanto do Poder Executivo, como do Poder Legislativo, quando então é chamado a atuar.

Com efeito, em um primeiro momento, o controle a ser exercido pelo Poder Judiciário sobre Legislativo e o Judiciário, deveria ser o controle de constitucionalidade, que tanto o Poder Legislativo poderia concorrer, mediante a edição de Leis inconstitucionais, como o Poder Executivo, na medida em que sanciona as respectivas Leis.

Em relação a função a ser exercida pelo Poder Judiciário, esta, deveria estar adstrita a fiscalização da correta da criação e aplicação das normas constitucionais e infraconstitucionais no ordenamento jurídico brasileiro.

No entanto, em que pese a previsão constante acima, é inevitável que haja uma relativização da divisão do Poder da forma originária, desde que seja para a preservação do Estado de Direito.

Um exemplo desta relativização, seria a declaração de inconstitucionalidade em abstrato de uma Lei.

Ora, nesta situação, o Poder Judiciário estaria invalidando um ato legítimo do Poder Legislativo, em atenção a manutenção do Estado Democrático de Direito, mesmo que a referida Lei tenha sido editada por legítimos representantes do povo, que compõe o Poder Legislativo e tenha sido sancionada pelo Poder Executivo.

Por outro lado, o Poder Judiciário também passou, a partir da Carta Cidadã, a atuar na esfera dos demais poderes, no intento de ver efetivados Direitos Fundamentais, em especial os ligados as liberdades e as garantias, que representam as mais eficientes armas constitucionais contra o abuso das maiorias e do próprio Estado.  Desse modo, os direitos fundamentais representam contornos ao próprio poder político, incluindo o legislador, que não pode dispor de seu núcleo irredutível, ainda que sua restrição represente um benefício para a maioria da população, o que também deverá ser controlado pelo Poder Judiciário, guardião da Constituição Federal.

Além dos casos acima, pode-se observar que a partir da Constituição Federal de 1988, com a adoção do estado de direito, e o reconhecimento da existência de direitos sociais a serem protegidos, o Poder Judiciário passou a deter uma atuação marcante sobre o Poder Executivo.

É que diante do modelo constitucional adotado, é claro que o Estado passou a ter sua atuação não mais submersa a uma prestação negativa, pelo contrário, a efetivação dos direitos fundamentais exigem uma atuação positiva do Estado.

Com efeito, justamente neste prisma é que surgiram as discussões de qual seria o papel do Poder Judiciário na sua função de guardião do controle de constitucionalidade e na preservação do estado de direito, ante a omissão do Poder Executivo na concretização dos direitos fundamentais, ou seja, se seria necessária a judicialização para fins de garantir o cumprimento dos direitos fundamentais.

Um exemplo claro do que está sendo tratado, são as recorrentes ações judiciais movidas contra o Poder Executivo no sentido de garantir o acesso a saúde e a educação, e que estão recebendo chancela do Poder Judiciário, que tem determinado ao Executivo que conceda medicamentos e leitos hospitalares a pacientes, assim como vagas em creches e em escolas públicas para alunos.

Evidentemente, que ao assim proceder, o Poder Judiciário acaba por interferir na esfera do Poder Executivo, na medida em que, caberia àquele poder, adotar medidas e políticas públicas capazes de possibilitar o acesso a saúde e a educação, nos termos do que prevê a Constituição Federal de 1988.

No entanto, ao omitir-se a este dever constitucional, o Poder Executivo acaba por relegar ao Judiciário, a missão de concretizá-lo, garantindo assim o cumprimento da previsão constitucional.

Por outra perspectiva, agora em relação ao Poder Legislativo, o Poder Judiciário também acaba, em determinadas situações, a interferir em seu campo de operatividade, na medida em que, ao Judiciário é imposta a obrigação de ao analisar o caso concreto, muitas vezes criar uma norma, através da interpretação do caso, para amoldar-se a ele, oferecendo assim uma resposta concreta ao jurisdicionado nos casos em que existe uma inconstitucionalidade por omissão ou inércia do Poder Legislativo.

Um exemplo clássico desta situação, de atuação positiva do Poder Judiciário em caso de omissão do Legislativo, e que inclusive possui previsão constitucional, é o mandado de injunção, que segundo a Constituição Federal, especificamente no art. 5, LXXI, prevê que: “sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. 

Logo, ao decidir questões como a posta acima, o Poder Judiciário acabará por definir o comportamento a ser adotado na efetivação dos direitos que se busca tutela, enquanto o Poder Legislativo se mantiver omisso. 

 

5. CONCLUSÃO

Por todas as questões pontuadas acima, se pode concluir que o modelo de tripartição do poder surgiu e disseminou-se nos países ocidentais a partir da obra de Montesquieu, em um período em que o liberalismo surgiu como contraponto aos modelos de governo absolutistas, cujo traço marcante era a manutenção do Poder Político nas mãos do governante.

Por outro lado, em que pese tenha sido subestimado por Montesquieu, que entendia que o Poder Judiciário tratar-se-ia de um poder secundário, após os países Europeus passarem a concentrar no Poder Judiciário o controle de constitucionalidade, o Judiciário assumiu uma situação de protagonismo.

No Brasil, a partir da Constituição Federal de 1988, que outorgou ao Poder Judiciário a função de realizar o controle constitucional das normas inferiores, além de zelar pelo Estado Democrático de Direito e de ser responsável pela efetivação dos direitos fundamentais, evidentemente que o Poder Judiciário passou a exercer uma função de protagonismo, na medida em que, inclusive, passou a interferir nos demais Poderes, seja nos casos de omissão ou de abuso de poder.

Exemplos desta atuação do Poder Judiciário dentro dos limites do Poder Executivo e Legislativo, encontra-se como demonstrado anteriormente, o mandado de injunção, para preenchimento de omissões legislativas e as tutelas concedidas com vistas a efetivação positiva de direitos sociais, como o acesso à educação e a saúde.

Desse modo, se pode concluir que atualmente existe uma evidente situação de protagonismo do Poder Judiciário, que inclusive penetra sobre os campos de atuação dos demais poderes, para garantia da nova ordem constitucional e do estado de direito.

 

REFERÊNCIAS

BIELSCHOWSKY. Raoni.  O Poder Judiciário na doutrina da separação dos poderes. Um quadro comparativo entre a ordem brasileira e a ordem portuguesa.

Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/496610/ 000966864.pdf?sequence=1

Acesso em: 16 de abril de 2016.

BRASIL. Constituição Federal de 1988.

LEAL. Vitor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto. O Município e o Regime Representativo no Brasil. 7ª Edição. Campanha das Letras. São Paulo: 2012. 

MAUDONADO. Murilo. SEPARAÇÃO DOS PODERES E SISTEMA DE FREIOS E CONTRAPESOS: DESENVOLVIMENTO NO ESTADO  BRASILEIRO

Disponível em: http://www. al.sp.gov.br/StaticFile/ilp/separacao_de_poderes .pdf

Acesso em: 16 de abril de 2016.

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